A historiadora e psicanalista Elisabeth Roudinesco em seu livro " Jacques Lacan – Esboço de uma vida, história de um sistema de pensamento" narra o seguinte episódio: Em 19 54, Lacan se encontrava empenhado em remontar a natureza subversiva do Freudismo as suas próprias origens, e consequentemente ao próprio Freud.

A historiadora e psicanalista Elisabeth Roudinesco em seu livro " Jacques Lacan – Esboço de uma vida, história de um sistema de pensamento" narra o seguinte episódio: Em 19 54, Lacan se encontrava empenhado em remontar a natureza subversiva do Freudismo as suas próprias origens, e consequentemente ao próprio Freud. A Lacan interessava em examinar, particularmente, a veracidade da famosa frase proferida por Freud ao visitar a América " Eles não sabem que viemos trazer a peste". Porém, como dar prova de tal afirmaçào quando ela nào se encontrava em lugar nenhum, sendo que o próprio Freud já havia falecido em 19 39 ? Lacan resolve esse delicado problema ao decidir visitar Carl Gustav Jung no final do ano de 19 54.

Cito Roudinesco:

"O mais célebre dissidente da saga freudiana estava então com 79 anos. Em sua esplêndida casa de Kusnacht, às margens do lago de Zurique, distribuia atenções, conselhos e erudição, qual um velho sábio oriental, aos numerosos visitantes vindos dos quato cantos do mundo para encontrá-lo. Consciente das dificuldades de chegar até ele, Lacan, havia pedido a seu colega Roland Cahen que interviesse a seu favor. Psiquiatra e germanista , Roland Cahen conhecera Jung em 19 36 , tornara-se seu discípulo, e depois realizara a primeira tradução francesa de suas obras..

( ....)Neste ano de 19 54, Jung ainda não havia empreendido a redação de suas Memórias , sua correspondência com Freud não fora publicada e nenhum trabalho biográfico a respeito dele estava em andamento. Para compreender a história das origens e do começo da psicanálise, dispunha-se apenas da hagiografia freudiana. Ora, sempre aparecia aí como uma personagem negativa e infiel face à sacrossanta figura do mestre vienense, apresentado como um herói sem temor e sem pecha. A idéia de Lacan de fazer Jung testemunhar sobre suas relações com Freud era portanto excelente.

O encontro realizou-se , mas Roland Cahen lamentou ser privado de Qualquer informação. Lacan lamais contou-lhe o que se passara, e Jung guardou da conversa apenas uma lembrança fugaz."

O que teriam conversado Jacques Lacan e Carl Gustav Jung ? Como deve Ter sido este encontro? Quais seriam os temas de aproximação ou de irrefutável separação entre as teorias de ambos?

Este trabalho que aqui apresento é uma proposta de de um exercício ficcional e imaginativo para responder a algumas dúvidas que possam Ter sido provocadas por este encontro, singular e precioso, entre dois dos maiores analistas e pensadores do Inconsciente do século XX.

Afinal, o que haveria de comum entre Lacan e Jung ?

É possível conjugar a enunciação Lacaniana de que "O inconsciente é estruturado como uma linguagem" com o ditado Junguiano: "Todo processo psíquico é uma imagem e um imaginar " ? Como conciliar Linguagem e imaginação?

Penso que, neste momento é necessário retomar um certo período da obra de Jung que considero ainda muito pouco explorado e investigado dentro da psicologia analítica , me refiro à relação de Jung com a questão da linguagem. Relação claramente demonstrada num de seus primeiros e mais importantes trabalhos que é o teste de associação de palavras.

O teste de associação de palavras , que veio comprovar empiricamente a existência de vários complexos atuantes no psiquismo, é uma herança direta da influência de Pierre Janet na obra de Jung, visto que, durante os anos de 1902-1903, Jung fêz sua especialização clínica junto ao próprio Janet na famosa escola de Salpetriere.

Janet propunha um modelo dissociativo da psique, defendendo a idéia de que a consciência pode dividir-se em partes autônomas, e mesmo, em personalidades múltiplas de sofisticação e abrangência variadas. Ao desenvolver o famoso experimento de associação de palavras e introduzir a noção de complexo no vocabulário da psicologia, Jung explora e confirma a principal lição recebida de Pierre Janet : A psiquê , tal como se manifesta, é menos um continente do que um arquipélago, onde cada cada ilha representa uma possibilidade autônoma de organização da experiência psíquica.

O que quero destacar é que uma das primeiras formas que Jung encontra para comprovar a existência dos complexos é através do reconhecimento da suas manifestações, intrusões e intervenções no discurso do sujeito. As interrupções no processo associativo do sujeito, no seu discurso, ao ouvir determinada palavra-estímulo, aponta para a existência de um determinado complexo carregado de afeto psíquico ali naquele ponto. Ou seja, quando um complexo psíquico é constelado, consequentemente, o discurso e a fala do sujeito sofrem suas manifestações.

A partir deste ponto, podemos considerar que, através do teste de associação de palavras, a questão da linguagem se oferece, então, desde o início, como um campo habitado, experienciado e assujeitado aos complexos psíquicos presentes no inconsciente. Desta maneira, podemos dizer que nossa fala é governada pelos nossos complexos, ou seja, o sujeito que fala, não é senhor do que diz. Há um Outro que fala em nós, e esses outros , muitas vêzes, tomam a forma de nossos complexos.

Logo, o que quero destacar é o fato de Jung demonstrar que é na linguagem, isto é, nos efeitos e nas interrupções do discurso, que os complexos vão se presentificar para o sujeito como assim demonstram os testes de associações de palavras.

A partir desta perspectiva, consideramos que os complexos psíquicos não estruturam apenas nossos sonhos e nossos sintomas, como também estruturam nossa linguagem. A fala de um sujeito é determinada pelos seus complexos, ou seja, os complexos estão na própria linguagem do sujeito.

Porém, Jung prossegue suas investigações fazendo outras observações extremamente interessantes e originais.

Jung irá colocar, a partir de sua experiência clínica junto ao teste de associação de palavras, que quanto maior for o cansaço físico do sujeito, a sua falta de atenção, e a diminuição do seu nível de consciência, menor serão as associações feitas pelo "sentido" da palavra-estímulo, ou seja, pelo seu aspecto semântico. Nestes casos, diz Jung, a tendência será a associação ser feita de acordo com a similariedade no som, isto é, o padrão fonético.

As associações de palavras realizadas com o nível de consciência reduzido irão obedecer a um padrão de similariedade sonora. O que Jung está afirmando é que há um deslocamento das associações regidas pelo aspecto semântico para associações orientadas pelo aspecto fonético.

Cito Jung:

"Há um aumento considerável na proporção de associações sonoras naqueles sujeitos cuja capacidade de concentração se encontra enfraquecida devido a uma forte experiência traumática ( afetiva) como nos casos dos psicóticos."


Jung está a realçar a importância do aspecto sonoro/fonético presente nos processos inconsciente de associação. Ele comenta que sob condições normais, as associações sonoras sofrem um processo de inibição, isto é, existe sempre uma tendência a suprimir o aspecto fonético das associações. A partir desta preciosa pista dada por Jung, poderíamos colocar algumas questões: É possível falar de uma espécie específica de recalque do aspecto fonético/sonoro das associações? Sob condições normais, como Jung o define, estes componentes estariam localizados na sombra do discurso? Se considerarmos que " inibição" é um dos nomes do recalque, estará Jung postulando que é na Sombra que devemos procurar e tentar resgatar o aspecto fonético e sonoro de nossos discursos?


Novamente cito Jung:

"É sabido que durante o sono, a atenção ( atributo da consciência) é completamente obliterada. Logo, podemos concluir que o processo associativo que ocorre nos sonhos deve ser inteiramente baseado sobre imagens e fonemas e que o processo de associação inconsciente realiza-se através de padrões de similariedades de imagem e som."


Jung está reconhecendo o papel fundamental da imagem e do som na formaçào dos sonhos e das fantasias inconscientes e, consequentemente, nos leva de modo surpreendente e fascinante , a considerar a íntima relação existente entre fonética e imaginação, entre som e imagem. Jung está a propôr uma lei fundamental da imaginação e a dizer que seu modo de operaçào é sonoro, acústico e fonético. Aponta para a relação entre Logos e Imagem, entre palavra e fantasia, onde podemos entender que tanto as palavras como as imagens são fantasias sonoras. Logo, toda imagem psíquica aponta para uma estrutura verbal e para um modelo fonético.

É curioso notar que todas estas investigações e observações de Jung são feitas durante o ano de 1902, exatamente cinco anos antes de Ferdinand Saussure, começar o seu " Curso de Linguística Geral" em Genebra. É interessante notar que não há em qualquer parte da extensa obra de Jung, menção alguma ao nome de Saussure, mesmo que possamos traçar alguns paralelos entre a obra dos dois autores.

Para Saussure, toda palavra, o que ele chama de signo linguístico, tem o seu som, que ele chama de imagem acústica e possui o seu conceito, que é o significado que aquele som designa. A imagem acústica, esse som extraído de seu significado, para além do que o conceito a representa, este puro som, Saussure o nomeia como significante. Logo, o significante corresponde a própria imagem acústica, é o aspecto fonético do signo, descolado de qualquer vinculação com a questão do sentido ou do conceito. É este caráter material, acústico do significante que nos interessa realçar, pois nos parece, que é a esta dimensão significante das palavras /signo linguístico que Jung se refere ao afirmar a presença do aspecto fonético na experiência de associaçào de palavras.

Resumindo: Jung conclui que a consciência, a dimensão egóica, associa as palavras no eixo metonímico, de acordo com o eixo linear, obedecendo as formulações predicativas e espaço temporal. Quando há a diminuição do nível de consciência, isto provoca uma mudança significativa no modo de processo associativo regido pela metonímia para o modo metafórico enfatizando a similariedade imagem-som , e consequentemente a dimensão da imagem acústica. Logo, o movimento psíquico da consciência para o inconsciente é acompanhado por uma mudança linguística de uma ênfase egóica na questào do significado para uma insistência inconsciente na questão da "imagem-acústica", isto é, o significante.

É este ponto que gostaria de ressaltar: A palavra-imagem como equivalente à sua dimensão significante dentro do signo linguístico. Um ponto de intersecção, um território localizado de afinidades, entre a teoria Lacaniana do significante e a descoberta Junguiana dos processos de associação inconsciente sonoros e fonéticos através dos testes de associação de palavras.

Como pensar , então, a partir dos princípios da Psicologia Arquetípica de James Hillman a questão da linguagem e suas repercussões na prática clínica?

A proposta é então tentar liberar e abrir o ego para toda a riqueza polissêmica do discurso imaginal, reduzindo ao máximo a influência da gramática e da sintaxe ao discurso. Busca-se diminuir as intensidades da gramática e da sintaxe presentes em excesso no discurso para que a pluralidade e a polivalência da linguagem metafórica da alma posa se expressar. O que a consciência egóica opera é a redução e o cerceamento de toda a vastidão polissêmica que está contida nas palavras-imagens dos discursos . É fundamental, então, buscar e resgatar este discurso plural e metafórico da alma a fim de preservar uma multiplicidade de sentidos plurais que as imagens-significantes contêm.

Poderíamos falar de uma nova re-orientação da clínica Junguiana, como sendo, uma clínica fundada na primazia da imaginação e no inerente politeísmo de seu discurso.

O trabalho imagístico, que caracteriza a prática Junguiana, torna-se um trabalho com as palavras, visando libertar a linguagem de um monoteísmo de um único sentido para o politeísmo do campo das múltiplas e diversas significações. Logo, a clínica Junguiana se torna uma clínica das palavras, já que imagens são palavras, uma clínica que se aproxima de um fazer literário e poético, seguindo os passos apontados por Jung ao aproximar imaginação e linguagem.

Queria ilustrar com dois exemplos clínicos.

Uma paciente homossexual cujo questão atual em análise é o rompimento da relação amorosa com a sua companheira traz o seguinte sonho:

" Estou indo viajar e me vejo no aeroporto. Estou comprando a minha passagem no balcão e no momento em que acabo de comprar, tomo um susto, pois percebo que esqueci a mala."

Eu pergunto: Você esqueceu o quê?

Ela responde: Esqueci a mala.

Eu a indago: Será que você não esqueceu de "amá-la" ?

Frente a pontuação, a paciente entra em um choro convulsivo e todo o sentido do sonho caminha para uma outra direçào.

Minha intervenção aponta não para o sentido literal da palavra "mala", mas sim aponta para a sua dimensão sonora, acústica,a propôr uma subversão do sentido, uma palavra que foi re-imaginada a partir da perspectiva metafórica da alma. O que nos interessa é libertar a palavra do aprisionamento restritivo do Logos , de seu confinamento nas vias estreitas do sentido. Dizer que a paciente esqueceu de amar a sua companheira, ou seja, de amá-la, ao invés de ficar fixado no referente concreto "mala", é lança-la em outra ficção, em um novo enredo imaginativo, em novas possibilidades de significações. Neste caso, não foi a mala e sim o amor que foi esquecido.

Um outro paciente , artista gráfico, em profundo estado de tristeza após o término do casamento, fixa-se na cena da separação, onde a ex-mulher estava com um vestido de cor amarela. Fente a esta cor amarela, ele desenvolve uma série de comportamentos sintomáticos e fóbicos como eliminar esta cor de seus trabalhos, jogar fora peças de roupa e objetos do trabalho e de casa que tenham esta cor.

A cor amarela é arremessada furiosamente na sombra de seus afetos. Até que, finalmente, ele começa em análise a poder estabelecer uma outra relação com esta palavra, a partir do momento em que o analista comenta que deve ser muito difícil para ele se livrar de "amar ela". É , neste momento, em que você como analista ao provocar o estranhamento da certeza do sentido, abre espaço e inaugura uma outra possibilidade de "fazer-alma" com as palavras.

Um belo outro exemplo é quando Djavan nos fala que:

"Vem me fazer feliz

Porque eu te amo

Você desagua em mim

E eu oceano"

Como pode um substantivo , oceano, virar verbo? Eu oceano, tu oceanas, ele oceana,....? Somente a imensa capacidade imaginativa e lírica dos poetas para poder transformar a palavra literal em palavra metafórica. Se pensarmos oceano apenas como substantivo, perdemos definitivamente o entendimento poético da frase.

Logo, a questão que se coloca é: Como transformar uma palavra literal em palavra metafórica?

Não seria este, por excelência, um procedimento alquímico? Ao olharmos para os alquimistas e para os seus tratados, nos perguntamos: Os alquimistas estão jogando com palavras ou substâncias? Eles trabalhavam no nível literal dos objetos de referência ou com a polissemia inerente dos significantes? Ao descrever uma operação nomeada "Solutio", eles estavam se referindo a uma substância líquida ou a uma solução de problemas? E a Sublimatio? É uma transformação dos instintos em imaginação ou a transformação entre os estados sólidos e gasosos? Novamente, refaço a pergunta: Estariam os alquimistas trabalhando no nível literal dos objetos/sentidos ou com a polissemia inerente dos significantes?

A partir do pressuposto de que se uma das metas da alquimia envolve a libertação da alma do seu aprisionamento na matéria, poderíamos falar , então, de um alquima do discurso, uma atividade alquímica e literária capaz de libertar a polissemia da alma que está aprisionada no literalismo dos significados?

Este é meu desejo: Pensar a clínica Junguiana como uma clínica da alquimia do discurso, onde a matéria, os objetos literais de referência – os referentes – transformam-se em possibilidades imaginativas, metafóricas e poéticas presentes nas imagens dos discursos. Uma atitude alquímica que envolva tanto analista como paciente na direção de libertar a alma que está presa nas palavras, uma alforria da rigidez dos sentidos neuróticos, para ir em busca de uma poética alquímica junto as palavras.

Propôr uma clínica Junguiana como sendo uma prática da alquimia do discurso envolve repensar também a idéia de individuação, agora concebida também, como um processo de individuação das palavras, isto é, torcê-las, reinventá-las, dobrá-las ao avesso, diferenciá-las umas das outras, num processo infindável e inesgotável de erotização do verbo. Queremos pensar que a idéia da individuação das palavras como algo fundamental e inerente ao processo de individuação do sujeito. A individuaçào concebida como uma atitude ética e erótica frente ao mundo das palavras.

Nesta busca de intimidade com as palavras, evidencia-se o desejo de não deixá-las sucumbir ,neuroticamente, frente ao estéril e normativo senso comum. Há toda uma nova direção clínica apontada neste momento, pois renuncia-se a qualquer tentativa de se trabalhar com a idéia de uma interpretação correta. Considerar que há uma interpretação correta a se fazer é acreditar que há um sentido último a garantir a estabilidade das palavras. Pensar numa clínica Junguiana como uma clínica da alquimia do discurso é sustentar que todas as interpretações são sempre parciais, serão sempre contextuais e que, todo sentido é, em última instância, mortal.

Para finalizar , gostaria de utilizar alguns trechos da obra poética do poeta pantaneiro Manoel de Barros, como sendo um dos melhores exemplos para ilustrar aquele, que verdadeiramente, merece ser considerado um alquimista das palavras.

Manoel de Barros é um alquimista do verbo, um amante das palavras, alguém que enlouquece os verbos até o ponto em que o verbo possa transfigurar a natureza, humanizá-la. Em Manoel de Barros , suas metáforas cumprem a função das metáforas, ou seja, expandir e ampliar a nossa imaginação e como bom pantaneiro, Manoel bem já o sabe que o Pantanal é um dos nomes do inconsciente. Manoel de Barros é um mestre da linguagem e um artesão das palavras, e que nós como analistas , temos muito o que aprender , pois como bem ele diz: " Os delírios verbais me terapeutam".

De sua extensa obra, selecionei três pequenas passagens que muito, creio eu, podem nos servir em nosso ofício de analistas.


"A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem até o ponto em que ela expresse os nossos mais profundos desejos."

Desarrumar a linguagem, e não tentar consertá-la, corrigí-la. Nenhuma proposta de normatizar ou adaptar a linguagem aquilo que se espera dela. Não se trata de corrigir o que é dito e sim de aceitar aquilo que silencio o ego e irrompe à boca pelas vozes dos nossos outros internos. Criar condições para que em análise, ocorra o desejo de individuação de nossas palavras. Individuar é desarrumar a linguagem até que ela expresse os nossos mais profundos desejos.

"Palavra poética tem que chegar ao grau de brinquedo para poder ser séria"

É preciso que nós analistas, tomemos as palavras como brinquedos, se faz fundamental manuseá-las intensamente, sem pudor, sem excesso de respeito e sem formalismos. A busca de maior intimidde com as palavras caminha pelo campo da literatura e da poesia. Um trabalho mais regido por Orfeu, Dioniso, Eros e Hermes do que Zeus, Apolo e Atená. Fazer da interpretaçào um ato poético que descortina a dimensão lúdica que habita as palavras. Frente a sisudez da rigidez neurótica, a fixaçào da fantasia, apresentar o caráter irônico, paradoxal e libertário contido na dimensão das palavras.

E um último poema:

"Descobri aos 13 anos que o que me dava prazer nas leituras nào era a beleza das frases, mas a doença delas.

Eu pensava que fosse um sujeito escaleno.

_Gostar de fazer defeitos nas frase é muito saudável, o padre me disse.

Ele fez um limpamento em meus receios.

O padre me falou ainda: Manoel, isso não é doença, pode muito que você carregue para o resto da vida um certo gosto por nadas.

E se riu.

Você não é de bugre? _ Ele continuou.

Que sim , eu respondi.

Veja que bugre só pega por desvios, não anda em estradas_

Pois é nos desvios que encontra as melhores surpresas e os ariticuns maduros.

Há que apenas saber errar bem o seu idioma.

Esse padre Ezequiel foi meu primeiro professor de agramática.

Creio que é esta a licão que o poeta nos deixa.

Ser analista, ser um alquimista da palavra, consiste necessariamente em muito estudar a sua língua para, simplesmente e à serviço da alma do discurso, bem saber errar o seu idioma.


Águas de Lindóia – SP

Outubro/2001

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